Etapa diocesana que busca a beatificação e canonização de Rutilio Grande chegou ao seu fim. O processo documental que testemunha a vida do sacerdote assassinado em Aguilares será enviado ao Vaticano, para ser apresentado à Congregação para a Causa dos Santos. Neste dia, a Igreja católica salvadorenha o torna oficial.
Foi um ato solene do início ao fim, que na terça-feira passada reuniu vários líderes da Igreja católica e alguns convidados, que no arcebispado observaram como se lacrava a documentação em um processo jurídico. O sacerdote Edwin Henríquez, vice-postulador nacional da causa de beatificação, é quem viajará a Roma para entregá-lo a Anton Witwer, postulador geral dos jesuítas, que o apresentará à Congregação dos Santos.
O processo de coleta de provas para a beatificação de Rutilio começou há pouco mais de um ano e, neste período, se entrevistou várias testemunhas que deram fé da vida e obra do sacerdote. O postulador nacional monsenhor Rafael Urrutia explicou que uma vez apurado, envia-se um arquivo ao Vaticano e outro fica lacrado no país “e não se pode abrir, sob nenhuma causa”, sem a autorização do arcebispo José Luis Escobar.
“É grande o descanso que isto nos dá”, disse Urrutia, em alusão à finalização da etapa nacional e agradeceu às testemunhas, à Companhia de Jesus pela colaboração e o apoio recebido. O sacerdote, que também é chanceler do arcebispado, era o designado para viajar a Roma, mas por causas de saúde é Henríquez quem cumprirá a missão de levar o material. De fato, Urrutia até brincou, na terça-feira, com a designação. “É mais jovem, mais robusto e com boa saúde”, disse em alusão ao vice-postulador.
Rutilio, um homem de Deus
Concluir o processo era uma evidente alegria para a cúria reunida no arcebispado, cuja sensação é que Rutilio logo estará nos altares. Assim é o parecer do arcebispo Escobar, que agradeceu a Companhia de Jesus por deixá-los levar o processo diocesano, o apoio da nunciatura apostólica e às testemunhas, a todos expressou uma “profunda gratidão”.
“Rutilio foi um homem de Deus”, disse Escobar, fazendo alusão às palavras do Papa Francisco, quando se reuniu com ele, em Roma, antes da beatificação de Dom Óscar Arnulfo Romero, e expressou “Que bom que já vimos subir aos altares Dom Romero e, em Deus, logo veremos subir Rutilio”.
Escobar se mostrou sumamente confiante que o processo de Grande terá uma rápida resposta por duas razões: “há muita bondade no Papa” e porque o mesmo conhece muito bem o caso do sacerdote assassinado em Aguilares, no dia 12 de março de 1977, junto a Manuel Solórzano, de 72 anos, e Nelson Rutilio Lemus, de 16.
O otimismo envolveu também o núncio apostólico, León Kalengo, igualmente presente no ato, que pediu “muitas orações” para tornar possível a beatificação de Rutilio e se estendeu ao dizer que as petições devem ser pela beatificação de Rutilio e a canonização de Dom Óscar Arnulfo Romero.
O núncio brincou que após apresentada a documentação, agora a Igreja salvadorenha, junto à cúria jesuíta e o Vaticano, “estão em uma partida de tênis de mesa”, pela qual é necessário rezar muito pela devida culminância do fato.
“El Salvador é um país de mártires, houve muito sangue derramado e é necessário encontrar o perdão”, disse Kalenga, em alusão a que a nova beatificação solicitada é parte dessa reconciliação, que ainda não se completou no país.
O representante do Papa no país também teve palavras para a Companhia de Jesus, sobre a qual expressou: “pagou um preço muito caro”, aludindo também ao assassinato de outros seis sacerdotes jesuítas e suas duas colaboradoras, em novembro de 1989: “um dia, teremos que lhes pedir perdão”, disse em intenção direta à sociedade salvadorenha.
Aqueles que não conseguiam esconder sua satisfação e felicidade eram os sacerdotes jesuítas que presenciaram o ato. O ex-reitor da Universidade Centro-Americana José Simeón Cañas (UCA), José María Tojeira, se referiu ao fato como “um orgulho e felicidade”, pois também é uma forma de fazer justiça ao sacerdote assassinado, no sentido de reconhecer seu martírio.
“Rutilio Grande é um homem que uniu três grandes amores: o amor ao povo salvadorenho, o amor à Igreja salvadorenha e o amor à Companhia de Jesus”, disse Tojeira, que destacou que sendo um formador renomado no Seminário São José da Montanha, preferiu se transferir a uma comunidade, para estar à frente de uma paróquia.
“Para nós é uma grande alegria que essa conjunção de amores seja reconhecida, além de seu martírio, como um elemento de santidade da Igreja. É uma grande satisfação para todos”, disse o sacerdote jesuíta.
De igual maneira, Tojeira comentou o “sacrifício” da Companhia de Jesus, mencionado por Kalenga. Disse que, “durante este tempo de guerra e de conflito, a companhia quis acompanhar os direitos das pessoas mais simples e pagou um preço alto, mas também faz parte de nossa vocação”.
O jesuíta não duvidou que o processo de beatificação solicitado é uma forma de reparação pelo assassinato consumado: “Claro que anima, é uma forma de reparação, de alegria, de esperança também para o povo salvadorenho, eu acredito que figuras como as de Rutilio unem muito as pessoas, pois era um homem totalmente dedicado a servir os demais”.
Tojeira disse que embora não se inicie o processo dos outros seis jesuítas assassinados, obviamente é um processo que não pode ser detido, porque, além disso, há outros sacerdotes e leigos que merecem o reconhecimento.
A Igreja católica tem previsto divulgar, agora, qual será o processo a seguir no Vaticano, a respeito do padre Rutilio Grande. Isso implica viajar a Roma (não disseram a data na terça-feira) e apresentar a documentação ao postulador da causa, Witwer, para que este também a apresente à Congregação dos Santos, da Santa Sé.